Estresse e os custos energéticos para o cafeeiro

Estresse e os custos energéticos para o cafeeiro

Especialista em fisiologia analisa riscos para a planta em anos de bienalidade negativa

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Pela fotossíntese das folhas, o cafeeiro produz glicose. Que serve, pois, como substrato para a respiração (Glicólise, Ciclo de Krebs e Cadeia de Transporte de Elétrons Mitocondrial). E essa etapa, a princípio, tem como uma das funções produzir energia na forma de ATP (36 ATPs/glicose).

O professor de fisiologia e engenheiro agrônomo José Donizeti Alves avalia o processo e explica os custos energéticos para a planta. “O pool de Adenosina Tri Fosfato (ATP) serve como um depósito temporário de energia, que é prontamente utilizável pela célula na realização de suas funções, entre elas: fazer a planta crescer, produzir e sobreviver”, diz.

Custos energéticos para o cafeeiro

Para cada um desses processos, no entanto, requer uma certa quantidade de energia. Em termos bioquímicos, é definida como custo energético de construção ou preservação. Que é a quantidade de glicose, carbono ou ATP que a planta utiliza para formar um grama de biomassa ou de grama de biomoléculas, respectivamente.  

Sob condições normais de clima e com um manejo adequado, por exemplo, a maior fração dessa energia é carreada para atender os processos de crescimento e produção. E, assim, uma pequena parte é utilizada no combate aos estresses do dia a dia.

Por outro lado, sob condições de clima adverso ou de manejo inadequado, a maior parte da energia é desviada. Para montar estratégias de sobrevivência e não para os processos de crescimento e produção.

É preciso entender a Bienalidade

Nesse contexto, é importante destacar que o alto crescimento vegetativo do cafeeiro, em anos de bienalidade negativa, logicamente não traz de imediato nenhum benefício para a produção. Pois os custos energéticos de construção de folhas (biomassa fotossinteticamente ativa) são geralmente muito elevados.

Entretanto, a médio prazo, essa alta demanda de energia leva a grandes benefícios à produção. Pois a alocação preferencial de energia para mecanismos de crescimento vegetativo aumenta o balanço de energia para próximo ano. Dessa forma, em um ano de bienalidade positiva o crescimento predispõe a lavoura a produzir mais. 

Portanto, ao contrário do que muitos pensam, aceitar a bienalidade não é negar o papel central da produção de grãos pelo cafeeiro, mas sim reconhecer que a produção de biomassa, além de um meio de produzir e armazenar energia é, também, uma estratégia que o cafeeiro utiliza para deixar mais descendentes (sementes) no próximo ano.

Como resultado, esse raciocínio leva a concluir que alta produtividade, com alto custo metabólico para produção de um número elevado de sementes pode levar, consequentemente, a um fator de estresse para o cafeeiro, em ano de bienalidade negativa. Pois, por analogia, há uma alternância de produção entre os anos.

Biomassa

Do mesmo modo, sob o ponto de vista evolutivo, a planta é apenas o meio pelo qual a semente utiliza para produzir mais sementes. Assim, para sobreviver a estresses como a estiagem, por exemplo, o cafeeiro lança mão de estratégias que gastam muita energia, mas que, no curto prazo, não se revertem em alocação de biomassa verde.

Reconhecido o estresse no cafeeiro, quando murcham as folhas apenas nas horas mais quentes do dia, aumenta a respiração (consome mais glicose) para produzir mais energia, a ser utilizada, por exemplo, na síntese de ABA (para fechar os estômatos) e de etileno (para inibir o crescimento), ativação de sistemas antioxidantes e produção de outras moléculas sinalizadoras. 

Na sequência, quando o estresse já está instalado e é perceptível pelas folhas murchas ao amanhecer. A planta aumenta ainda mais a produção e gasto de energia. Acelerando o consumo de glicose, a fim de produzir mais energia para usá-la na síntese de produtos secundários.

Nesse caso, são verificadas modificações morfológicas como proliferação de radicelas; diminuição de estruturas reprodutivas; espessamento de folhas; modificações celulares como deposição de cera e cutícula; lignificação de tecidos; proteínas de transporte de membranas; rearranjo nos lipídeos das membranas; síntese de moléculas osmoticamente ativas e aquaporinas e; finalmente, elevação na síntese de etileno com a produção de níveis tóxicos de EROS.

Do mesmo modo, com a intensificação do estresse, a pressão ambiental rompe as barreiras de defesas. E inicia-se a morte de radicelas, queda de estruturas reprodutivas, ramificações e ramos ladrões, modificações celulares como cavitação no xilema, disparo na síntese de etileno, aumento na toxidez das EROS. Bem como paralisação na síntese de antioxidantes que, em conjunto, dá início à senescência geral da planta.

Riscos para a planta

Finalmente, como golpe final, há o esgotamento das reservas e da energia das plantas com o iminente colapso de todas as funções fisiológicas do cafeeiro. Como resultado, a produção é mínima (catação) e o replantio, por fim, é a única solução para a continuidade da atividade cafeeira.

Em conclusão, os custos energéticos dos estresses do cafeeiro acabam desviando a energia que poderia utilizar para o crescimento vegetativo e reprodutivo. Esses custos, finalmente, ficam concentrados em processos de sobrevivência. R esultando em menor volume de safra, que no caso do cafeeiro pode-se estender por até dois anos.

Assim, qualquer semelhança com os dois últimos anos agrícolas, onde tivemos uma seca prolongada, intercalada por geadas e perdas, com comprometimento da produtividade nas lavouras, não é mera coincidência.

*Prof. Dr. José Donizeti Alves é Engenheiro Agrônomo e especialista na área de Fisiologia da Produção do Cafeeiro.

 – FisioCafé Consultoria e Palestras Ltda – fisiocafeconsult@gmail.com 


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