Fórum Café e Clima: Mudanças climáticas provocam alterações na produção do café
Pesquisas apontam que questões climáticas, como o aquecimento global, interferem na safra cafeeira
As mudanças climáticas no Brasil estão cada vez mais perceptíveis e já é sabido que o clima exerce forte influência no desenvolvimento do cafeeiro. Entretanto, nosso país é o maior produtor e exportador de café do mundo. E é preciso que os cafeicultores preparem adequadamente suas lavouras para evitar alterações na produção.
Assim, para entender melhor como as condições meteorológicas ocorridas entre agosto de 2021 a abril de 2023 afetaram a safra cafeeira que está sendo colhida neste ano, o professor de Fisiologia da Universidade Federal de Lavras (UFLA), José Donizeti Alves, vai ministrar uma palestra sobre o tema no 5º Fórum Café e Clima.
Antes de mais nada, o evento é promovido pela Cooxupé. E será realizado no dia 27 de julho, das 14h às17 h, na matriz da cooperativa, em Guaxupé (MG). Além disso, o encontro será transmitido ao vivo, on-line, pelo Hub do Café e pelo canal da Cooxupé no Youtube.
Em entrevista para o Hub do Café, pois, o professor traçou um panorama sobre as alterações de clima em outras partes do mundo. Ademais, fez um paralelo com o Brasil. Por fim, explicou o que os produtores cooperados podem fazer para garantir uma boa safra em 2024 e evitar os prejuízos somados desde 2020.
Mudanças climáticas no mundo
De acordo com José Donizeti, foi publicado um artigo de um grupo que estudou a influência do clima no desenvolvimento do café robusta no Vietnã. Após 10 anos de pesquisa em 558 propriedades, portanto, eles chegaram à conclusão de que os estresses ambientais, ligados às alterações dos padrões climáticos devido ao aquecimento global, induzem florada precoce no robusta.
Dessa forma, os pesquisadores constataram que cafeeiros que floresceram mais cedo são mais sensíveis aos estresses climáticos. E que a antecipação da florada reduz o efeito benéfico do uso dos fertilizantes.
“Outra pesquisa apontou que, no Hemisfério Norte, mudanças climáticas atribuídas ao aquecimento global estão antecipando o crescimento das árvores em duas semanas. E que as folhas estão senescendo mais cedo. Esse envelhecimento precoce diminui a quantidade e eficiência fotossintética das árvores durante sua vida útil, decrescendo a produtividade”, detalha.
Paralelo com o Brasil
Para o professor, em outras palavras, é possível fazer um paralelo desses estudos com o que está ocorrendo no Brasil. Particularmente com o café arábica.
Ainda que não existam pesquisas da magnitude que foi feita no Vietnã, é possível que esse cenário de florada precoce também aconteça com o café arábica no Brasil.
“É notório que, em diversas propriedades, estão ocorrendo floradas em maio e junho. Para muitos cafeicultores, este florescimento antecipado, de tão volumoso, parece ser uma das principais floradas para esse ano. E, neste caso, isso é preocupante, pois caso se observe que a pressão do clima está alterando a fenologia do café, os cafeicultores têm que olhar menos para o calendário e ficar atentos para adequar a época dos tratos culturais ao estádio fenológico das lavouras”, ressalta.
Ainda assim, em relação à pesquisa em que constataram que folhas de árvores no Hemisfério Norte senescem precocemente, o mesmo pode ocorrer com os cafés brasileiros. Entretanto, com os frutos.
Amadurecimento
Conforme José Donizeti, se considerarmos que, após o amadurecimento, os frutos entram em senescência e secam – o que reduz a janela de cereja –, é possível que temperaturas mais altas durante o dia estejam antecipando a senescência. Isto é, o envelhecimento dos frutos, o que faz com que os cerejas passem rapidamente para passa e seco.
Por outro lado, em muitas regiões, notadamente com noites mais frias, está acontecendo o contrário.
“As lavouras estão com uma grande percentagem de frutos verdes, firmemente atados aos ramos com um atraso de até duas semanas na granação e/ou amadurecimento completo. Enfim, ao que tudo indica, essas súbitas mudanças climáticas que alargam a amplitude térmica, seja por médias máximas mais elevadas ou médias mínimas mais baixas, parecem exercer um efeito direto no processo de frutificação do café arábica”, analisa.
Entretanto, ele afirma que são hipóteses que precisam ser testadas. Inclusive, se isso de fato está ocorrendo no país e qual é o grau de correlação com as alterações climáticas.
“Do ponto de vista fisiológico, essas anomalias (florada precoce, expansão da fase verde e encurtamento da fase cereja dos frutos) são passiveis de estar ocorrendo, principalmente em condições tão variáveis do clima”, conclui.
Desenvolvimento do cafeeiro
Em sua palestra no 5º Fórum do Café e Clima, intitulada “Como a interação clima-planta nos últimos dois anos modelou a safra atual de café”, o professor José Donizeti vai mostrar, do ponto de vista fisiológico, como o clima moldou as safras 2020, 2021, 2022. Até chegar na safra atual e as possíveis inferências, até o momento, sobre a safra 2024.
“O volume de cada safra é um reflexo daquilo que aconteceu com o clima nos dois anos agrícolas que as antecederam. Para o bem, como na safra 2020, e para o mal, como nas safras posteriores a ela. Todo ano, desde 2020, de três a quatro desses extremos de calor, seca, chuva, nebulosidade, granizo, frio e geada ocorreram, em um mesmo ano agrícola, em nossas lavouras”, explica.
Clima
Sobretudo, sempre que a pressão do clima extrapola certos limites, como vem ocorrendo nestes anos, o cafeeiro reduz drasticamente a fotossíntese. E, como consequência, a produção de energia, destaca o professor. “Desse modo, plantas, antes vigorosas, passam para a condição de depauperadas, esgotando quase que por completo o ‘pool’ de energia que estava disponível para a produção”, ressalta.
Neste ponto, em suma, o cafeeiro inverte o fluxo de energia na direção de mecanismos moleculares, bioquímicos, fisiológicos, anatômicos e morfológicos, que garantam sua sobrevivência. A fim de aliviar as demandas das fontes, ele perde folhas, cresce menos, aborta flores, derruba frutos e produz menos.
“Traduzindo: isso foi o que aconteceu com as safras 21, 22 e, com menor intensidade, na atual que estamos colhendo. Para o próximo ano, espera-se uma safra maior que a atual”, informa José Donizeti.
Safra 2024
Em conclusão, diante do atual cenário, de fortes pressões climáticas sobre a cafeicultura brasileira, os produtores cooperados se preocupam em trabalhar para garantir uma boa safra em 2024. E, ainda, evitar os prejuízos somados desde 2020.
Com isso, o palestrante argumenta que a boa notícia é que o cafeeiro é uma planta resiliente. E sempre volta a produzir bem depois de um forte estresse.
Porém, pelas peculiaridades de uma espécie originada de ambientes sombreados, essa resiliência, geralmente, não se expressa no mesmo ano.
“Às vezes, demora de dois a três anos para a planta se recuperar. Por exemplo: a recuperação de uma lavoura pela poda do tipo safra zero leva dois anos. A recuperação de intervenções mais drásticas no cafeeiro, após uma geada severa, leva de dois a três anos. A saída de uma condição de depauperamento, depois de uma safra alta, demora dois anos. Daí o termo bienalidade. Enfim, há de ter perseverança”, aconselha.
Adversidades climáticas
Em adversidades climáticas, em síntese, o professor orienta os cooperados a manter as folhas do cafeeiro sempre verdes. E o sistema radicular o mais profundo possível.
Isso porque lavouras com essas características terão melhores condições fisiológicas de acionar rotas metabólicas para a produção de defesas antioxidantes. Ademais, criar estruturas anatômicas que as tornem mais tolerantes aos estresses hídrico e térmico. Além de alterar sua morfologia e criar estruturas de parte aérea e de raízes capazes de minimizar os efeitos desses estresses.
E, principalmente, equilibrar as relações fonte-dreno, a fim de adequar a produção e o uso de energia para crescer e produzir mais, em condições favoráveis.
“Esses atributos, se presentes, poderão servir de importantes ferramentas para o cafeeiro expressar sua plena resiliência. E, quando em condições desfavoráveis ou de forte pressão ambiental, reduzir as perdas ao mínimo possível”, ensina José Donizeti.
Programe-se
5º Fórum Café e Clima da Cooxupé
- Data: 27 de julho
- Horário: das 14h às 17h
- Evento também será transmitido pelo portal Hub do Café e pela página da cooperativa no Youtube
Programação:
- 14h00: Abertura com Diretoria da Cooxupé
- 14h15: Palestra de Guilherme Vinícius Teixeira, engenheiro agrônomo do Departamento de Geoprocessamento da Cooxupé. Tema: as condições meteorológicas e suas consequências nas regiões em que a cooperativa atua.
- 15h00: Palestra de Marco Antônio dos Santos, agrometeorologista da empresa Rural Clima. Tema: as previsões de clima para os próximos meses nas diversas regiões cafeeiras do Brasil.
- 15h45: Palestra de José Donizete Alves, professor da Universidade Federal de Lavras (UFLA). Tema: como as condições meteorológicas ocorridas entre agosto de 2021 a abril 2023 afetaram a safra atual de café.
- 16h30: Debate
- 17h: Encerramento