Agenda ESG está mais desafiadora, mas segue importante

Agenda ESG está mais desafiadora, mas segue importante

Empresas são pressionadas a avançar no tema. Porém, compromissos são colocados em xeque por eventos geopolíticos e diferenças partidárias

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Nos últimos tempos, as empresas têm sido cobradas a adotar as práticas da agenda ESG. Em inglês, a sigla significa responsabilidade ambiental, social e de governança corporativa. No entanto, o Thomson Reuters Institute produziu o relatório ESG Sob Tensão, em setembro de 2022. Como informa o Valor Econômico, o parecer mostra as dificuldades para implementar os compromissos exigidos pela agenda ESG ao longo do ano passado.

De acordo com o levantamento, questões ambientais foram colocadas em xeque por conta da invasão da Ucrânia pela Rússia. Isso porque a guerra atrasou o cronograma da transição do uso de combustíveis fósseis para energias renováveis no continente europeu.

Contornos políticos

Nos Estados Unidos, a responsabilidade ambiental ganhou contornos políticos. Congressistas do Partido Republicano colocaram o rótulo de “esquerdista” aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs) da Organização das Nações Unidas (ONU), ligados ao clima.

Situação no Brasil

O desmatamento florestal na Amazônia e em outros biomas bateu recorde no ano passado, bem como os saldos das tragédias causadas por chuvas com volumes históricos, atribuídos às mudanças climáticas.

Além disso, flagrantes de trabalho análogo à escravidão se multiplicaram. Já a transparência corporativa como resultado de uma governança sólida foi abalada pelo rombo no balanço da Americanas, na casa dos R$ 40 bilhões.

Tensões em 2023

Esse quadro mostra que 2023 não será de menor tensão. Mas, não representa uma ameaça aos avanços de práticas sólidas em defesa da proteção ambiental, social e de governança. Especialistas afirmam que não haverá recuos na aplicação da agenda ESG.

“Temos muitos avanços a contabilizar. Pela primeira vez, vemos que a pauta deixou de ser boa para a marca e passou a ser importante para o negócio”, avalia ao Valor o líder de ESG e Sustentabilidade na América Latina da consultoria e auditoria EY, Ricardo Assumpção.

Agenda reconhecida

Especialista em sustentabilidade e com assento em importantes conselhos de administração, Sonia Consiglio ressalta que o setor privado brasileiro tem uma agenda ESG reconhecida no mundo. No entanto, alerta que tem espaço para fazer mais.

Nesse sentido, ela cita o Estudo de CEOs do Pacto Global da ONU com a Accenture. De acordo com a pesquisa, 98% dos líderes concordam que sustentabilidade é assunto primordial em seus cargos. Foram entrevistados 2,6 mil CEOs de 128 países de 18 diferentes setores.

A maioria dos participantes da pesquisa (93%) está enfrentando dez ou mais desafios simultâneos em seus negócios. Além disso, 87% deles acreditam que o nível de mudança está tão elevado que haverá impacto na entrega dos ODSs. “É preciso ter em mente que tudo que fizermos será mais lento, porque as demandas são muito grandes”, afirma Consiglio.

Nova consciência

De acordo com o executivo Rodrigo Gaspar, diretor de Desenvolvimento de Negócios do Sistema B no Brasil – movimento global com a missão de redefinir o sucesso da economia com base em critérios como bem-estar da sociedade e do planeta e não apenas financeiro -, há uma nova consciência no mercado. Tanto de empresários quanto de clientes.

“Ver indicadores ambientais em produtos é algo cada vez mais comum no Brasil”, diz Gaspar. Ele conta que, atualmente, as mais de 360 “empresas B” no Brasil devem cumprir com requisitos básicos a agenda ESG na ferramenta de gestão de impacto da plataforma. “A Avaliação de Impacto B eleva a barra destas empresas com busca por modelos de negócio de impacto que vão a camadas ainda mais profundas no impacto ambiental”, comenta o executivo.

“Vilões” da pauta ambiental

Antes de tudo, Assumpção, da EY, chama a atenção para a pesquisa Global Reporting and Institutional Investor Survey, realizada pela EY, junto a 1.040 líderes financeiros seniores de empresas e 320 investidores.

“Para 78% dos investidores entrevistados, as empresas devem fazer investimentos que abordem questões ESG relevantes para seus negócios, mesmo que isso reduza os lucros no curto prazo. O estudo também identificou que 99% dos investidores pesquisados utilizam as divulgações ESG das empresas como parte de suas decisões de investimento”, lembra Assumpção ao Valor.

Responsabilidade ambiental

Acima de tudo, os especialistas cobram maiores avanços no rastreamento das emissões na cadeia produtiva.

“As empresas avançaram na temática de mensuração das emissões de carbono de suas operações e no setor rural, mais especificamente, o interesse pela ‘agricultura regenerativa’ está ganhando cada vez mais espaço. Por outro lado, não avançaram muito na rastreabilidade de produtos que possam ter origem em áreas de desmatamento na Amazônia e Cerrado”, avalia o gerente de Cadeias Agropecuárias do Imaflora, Eduardo Trevisan Gonçalves.

Setor agro

Nesse sentido, Gonçalves explica que entende que as empresas do setor agro precisam avançar mais rápido em garantir produtos livres de desmatamento.

“A nova lei europeia, que restringe a compra desses produtos, está sendo implementada. E como a Europa é um importante destino de commodities brasileiras, esse é um ponto de extrema relevância”, alerta Gonçalves.

Área social

Do mesmo modo, se a responsabilidade ambiental é importante na agenda ESG, a área social também vem conquistando grande visibilidade no Brasil.

“Temas ligados a diversidade e inclusão, bioeconomia e pautas climáticas podem ser alvo de ações e políticas públicas. Vários ministérios, inclusive, estão recheados de pessoas que falam desses temas e até alguns cargos já têm no nome a pauta Étnico-racial, de gênero, entre outras”, destaca o CEO do Pacto Global da ONU no Brasil, Carlo Pereira.

Direitos humanos

De antemão, a dedicação aos direitos humanos já é pré-requisito na Europa, usada na nova legislação de finanças sustentáveis, segundo Rafael Benke, fundador e CEO da Proactiva, consultoria especializada em direitos humanos no ambiente corporativo.

No Brasil, já está em curso um Projeto de Lei (572/22) que estabelece um marco nacional sobre direitos humanos e empresas. O objetivo é estabelecer diretrizes para a promoção de políticas públicas sobre o tema.

Programa de diversidade

Desse modo, a KPMG Brasil produziu o ESG Brazil Yearbook a partir de informações públicas de cerca de 200 empresas listadas na Bolsa de Valores brasileira. O estudo mostra que 45,6% delas têm programa de diversidade atualmente. Em 2018, quando pesquisa começou a ser produzido, eram apenas 20%.

Por fim, em 2018, apenas 18,46% dos conselhos de administração eram considerados diversos. No ano passado, o número saltou para 30,98%.