Startup quer treinar abelhas para polinização do café

Startup quer treinar abelhas para polinização do café

Projeto apoiado pela FAPESP desenvolveu estratégia para polinização mais precisa, utilizando o aroma da flor do café

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Assim como os cães, as abelhas podem ser treinadas para desempenhar tarefas de farejamento. Entre as quais reconhecer com precisão a fragrância de culturas agrícolas de interesse econômico como, por exemplo, o café (Coffea arabica). E um estudo desenvolvido por uma startup mostrou que elas podem ajudar na polinização mais precisa, como mostra o site Um só planeta.

Abelhas para polinização do café

Dessa forma, as abelhas podem ajudar na polinização. Isso porque esses insetos têm capacidade de desenvolver memória olfativa, associando o ambiente onde coletam o pólen e o néctar de flores com o cheiro deles, conforme explica o ecólogo João Marcelo Robazzi.

“As abelhas usam sinais, como a cor e a fragrância, para encontrar e, consequentemente, polinizar flores. Esses sinais podem ser empregados para treiná-las em laboratório de modo que possam reconhecer mais facilmente culturas agrícolas-alvo quando suas colônias forem liberadas em lavouras e realizar a polinização de forma mais eficiente”, afirma.

Com base nessas constatações, Robazzi fundou uma startup durante seu doutorado em ecologia na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e em neurociências na Université Paul Sabatier, em Toulouse, na França.

Para isso, ele contou com a parceria da doutora em entomologia pela Universidade de São Paulo – USP Campus Ribeirão Preto, Marcela Barbosa, e da professora da Unicamp e pesquisadora da Agência Paulista de Tecnologia do Agronegócio (APTA), Maria Imaculada Zucchi.

Aroma do café

A ferramenta, batizada de PollinTech, melhora a precisão da polinização do café por abelhas africanizadas (Apis mellifera).

De acordo com o pesquisador, as abelhas são atraídas pelo odor das flores, ajudando na dispersão do pólen.

“O objetivo dessa estratégia de polinização guiada pelo odor é aumentar não só a produtividade como também a qualidade dos grãos de café”, explica Robazzi.

E para treinar as abelhas, os pesquisadores desenvolveram biomoléculas sintéticas, de misturas de odores artificiais, que são percebidas pelos insetos polinizadores como, por exemplo, o aroma floral natural do café.

Dessa forma, os pesquisadores esperam obter um aumento de mais de 18% na produção do grão.

O projeto tem apoio do Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), da FAPESP.

Maior qualidade dos frutos

Robazzi reforça que a estratégia, que ainda depende de experimentação, pretende levar ao aumento da produção de café e, consequentemente, melhor qualidade dos frutos.

“Já desenvolvemos uma solução que imita a fragrância da flor de café, na percepção das abelhas. Isso nos permitirá treiná-las em laboratório de modo que encontrem mais facilmente essa cultura-alvo no campo e, com isso, possa ser aumentada a taxa de polinização e, consequentemente, a produção do café e a qualidade dos frutos”, diz.

No entanto, resultados preliminares de experimentos em laboratório indicaram que as abelhas não perceberam diferenças entre a solução sintética e o aroma natural da flor do café.

“As abelhas identificaram nossa mistura como o odor da flor natural. Ao serem expostas a essa biomolécula sintética em laboratório, elas saberão qual cheiro deverão procurar quando forem liberadas em campo. Dessa forma, os eventos de polinização deverão ser maiores”, diz Marcela Barbosa.

Como resultado, estudos internacionais mostram que ao ter treinamento, as abelhas favorecem o aumento da produção de girassol em 57%.

Baixa conscientização da importância

De acordo com dados da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES, na sigla em inglês), cerca de 90% das culturas agrícolas produzidas em todo o mundo dependem, em algum grau, de polinizadores.

E as abelhas são as maiores polinizadoras, sendo responsáveis, em suma, pela polinização de 75% do total de plantas cultivadas em todo o mundo.

No Brasil, em síntese, o valor da polinização para a produção de alimentos é estimado em R$ 43 bilhões anuais.

Das 191 culturas agrícolas cultivadas no país revertidas em alimentos, 114 dependem da ação de polinizadores.

E o café, consequentemente, responde por 12% desse valor (R$ 5,6 bilhões).

Importância das abelhas

Marcela acrescenta outras vantagens da polinização. “Estudos indicam que os polinizadores aumentam em, aproximadamente, 18% a produção do café. Isso se reflete não só na quantidade como, também, na qualidade dos frutos gerados e do produto final. Alguns trabalhos mostram que a polinização pode também incrementar algumas características sensoriais da bebida”, conta.

E mesmo com tantas vantagens, muitos cafeicultores brasileiros ainda não conhecem ou não entendem a importância da polinização.

“Acreditamos que, no futuro, a comercialização da solução que desenvolvemos deve envolver um trabalho de conscientização e aprendizado por parte dos nossos clientes sobre a importância da polinização na cafeicultura”, afirma Robazzi.

Assim, as entrevistas com potenciais clientes para avaliar a viabilidade do trabalho indicaram que os produtores de cafés especiais são os maiores interessados no tema.

A ideia dos pesquisadores, agora, é testar a solução em campo e expandir a aplicação para outras culturas. Como, por exemplo, a laranja, o abacate e o açaí.

Confira aqui as apresentações das startups participantes do 22º Programa PIPE em Empreendedorismo de Alta Tecnologia.